Lula deixa regulamentação do Uber na mão de sindicatos e irrita motoristas

A regulamentação das relações de trabalho entre motoristas, entregadores e aplicativos está mais perto de se tornar realidade. No dia 1º de maio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinou um decreto criando um grupo de trabalho com representantes do governo federal, das plataformas e dos trabalhadores para elaborar uma proposta de Lei. O problema é que uma das partes mais interessadas, os prestadores de serviço, não se sentiu representada pelos sindicatos escolhidos para defender seus interesses.

O grupo de trabalho é formado por 45 pessoas. São 15 representantes do Governo; 15 representantes dos empregadores, como associações de mobilidade, tecnologia e economia, e 15 representantes de centrais sindicais, como CUT, CSB, Força Sindical, entre outras. Em conversa com motoristas e entregadores, a reclamação é sobre a ausência de associações e alianças que, de fato, sejam compostas por trabalhadores de aplicativo.

Eduardo Lima de Souza, presidente da Associação dos Motoristas de Aplicativo (AMASP), diz que a entidade é uma das que não está satisfeita com a escolha. “Deixaram de fora os verdadeiros representantes da categoria. Essas associações sindicais não representam os motoristas de aplicativo. Eles não têm noção do que é o nosso trabalho. Estão nessa representação porque o governo é sindicalista. Levaram a panelinha.”

Uma das principais preocupações da AMASP é que a comissão decida por aplicar as regras da CLT ao modelo de trabalho por aplicativo, alternativa defendida pela maior parte dos sindicatos.

“A CLT tira nossa autonomia, nos obrigando a cumprir horários e a fazer toda e qualquer corrida, mesmo sem nos sentir confortáveis. As plataformas e o Governo não nos oferecem segurança para trabalhar dessa maneira. O que nós queremos é ter direitos previdenciários, mas preservando nossa autonomia”, opina Eduardo.

A Associação de Motoristas de Aplicativo do Rio de Janeiro também não aprovou a decisão do Governo. “Um absurdo. As instituições que estão na lista não representam os motoristas. Só tem central sindical, as associações e a federação dos motoristas ficaram de fora”, comenta o presidente Denis Moura.

Já a Aliança Nacional dos Entregadores de Aplicativo (ANEA) está na expectativa de que o grupo de trabalho ainda os convide para o debate. “Nós, da Aliança, temos garantia do Executivo de que participaremos. Temos também uma composição com as centrais para que sejamos ouvidos. Além disso, nosso trabalho não se restringe ao Executivo: temos conversas com membros do Legislativo, na Câmara e no Senado, por onde o projeto passará”, avalia Marcelo Gomes Sobreira, um dos líderes do movimento.

Edgar Francisco da Silva, conhecido como “Gringo”, presidente da AMABR – Associação dos Motofretistas de Aplicativos e Autônomos do Brasil, também diz que tem esperança de que o Governo Lula os inclua na conversa. “Se a decisão for por não ter a associação na mesa, a gente vai fazer nosso barulho. Não podem definir algo que impacta nossas vidas sem nós. Mas não acredito que farão essa sacanagem tão grande, estamos cansados disso.”

Outro representante dos entregadores, líder de uma associação, disse que “os trabalhadores não concordam que as centrais devam ser protagonistas desse processo, já que não estiveram envolvidas nas construções da categoria. Os trabalhadores que lutam todos os dias para mobilizar e conscientizar a categoria são os mais aptos a fazer essa discussão. Não é uma questão de um tomar lugar do outro, todos podem discutir, mas com cada um sabendo de onde veio e por quem fala. O Governo acerta ao criar o grupo, e erra na forma como cria”.

Sindicatos vão intermediar a conversa

Questionamos o Ministério do Trabalho e Emprego para entender por que as associações não compõem o Grupo de Trabalho (GT). Em resposta, o ministério afirmou que “as centrais vão interagir com as principais representações, mesmo que não sejam associadas, terão suas reivindicações ouvidas no GT”.

Também procuramos as centrais sindicais que farão parte do debate, mas apenas a Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB) atendeu às ligações. O Central disse que o Grupo de Trabalho não é apenas para discutir as relações de trabalho com motoristas e entregadores de aplicativo, mas de todos os trabalhadores das plataformas, o que inclui, por exemplo, desenvolvedores de sistemas.

“O Governo incentivou que as associações se aproximassem das Centrais, pois pela Lei os sindicatos têm essa prerrogativa de debate. É difícil mensurar, de fato, quantos motoristas são representados pelas associações, é preciso uma institucionalidade”, afirmou a CSB, que garantiu estar em contato ao menos com a Aliança dos Entregadores.

A proposta defendida pela CSB é que sejam aplicadas as normas da CLT nas relações de trabalho por aplicativo. Na prática, os motoristas e entregadores seriam contratados das plataformas, como iFood e Uber. Para os trabalhadores eventuais, a relação se daria através de MEI.

“Nossa proposta se divide em três pontos: aplicação da Lei Trabalhista (CLT), seguridade social via previdência e exigência de transparência das plataformas – já que hoje eles bloqueiam trabalhadores de forma unilateral e, algumas vezes, injusta”, disse a entidade.

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