‘ACHADO POR PURA SORTE’: Novo dinossauro brasileiro lembra um tiranossauro em miniatura

Um dos menores e mais completos fósseis de dinossauro a ser descoberto no Brasil deve ajudar os cientistas a contar os começos de um grupo que daria origem a predadores quase tão temíveis quanto o célebre Tyrannosaurus rex.

De fato, a nova espécie brasileira, batizada de Spectrovenator ragei, lembra vagamente um tiranossauro em miniatura, embora pertença a uma linhagem bem distinta da do dino mais famoso. Com estimados 2,20 m de comprimento, o animal documenta um período pouco conhecido de sua família, a dos abelissaurídeos, que acabariam adquirindo porte avantajado e adereços cada vez mais barrocos na cabeça ao longo do período Cretáceo (a última fase da Era dos Dinossauros).

S. ragei, porém, ainda equivalia ao que poderíamos chamar de um “modelo básico” do grupo. “Entre os abelissaurídeos, ele é um dos menores, se não for o menor, ainda que todos os membros mais basais da família já fossem razoavelmente pequenos”, diz Hussam Zaher, paleontólogo do Museu de Zoologia da USP que coordenou a descrição formal da espécie. O trabalho foi publicado na revista científica francesa Comptes Rendus Palevol.

Pode-se dizer, aliás, que o pequeno carnívoro, com esqueleto quase completo (falta apenas a região torácica, as patas da frente e a porção central da cauda), veio “de brinde” durante a escavação de um bicho bem mais portentoso. No trabalho de campo perto do município de Coração de Jesus (norte de Minas Gerais), Zaher e seus colegas também encontraram o Tapuiasaurus macedoi, um herbívoro pescoçudo de 13 m de comprimento, com crânio bem preservado.

Spectrovenator estava embaixo do bicho maior. “Foi pura sorte mesmo achar os dois juntos”, diz o pesquisador da USP.

Tudo indica que, há 125 milhões de anos, quando os animais morreram, o lugar onde seus corpos foram depositados era uma borda de lago. O Tapuiasaurus apresentava marcas de mordida em seu pescoço, mas isso não significa que o dinossauro menor foi o responsável. “Um fato engraçado: o pé dele estava na boca. Durante a preparação dos fósseis [quando eles são retirados da matriz de rocha], parecia que ele estava mordendo os dedos”, brincou Rafael Delcourt, coautor do novo estudo e pesquisador de pós-doutorado na Unicamp, em suas redes sociais.

Dentes de abelissaurídeos são encontrados com bastante frequência em diversos sítios paleontológicos brasileiros com rochas do Cretáceo, mas esqueletos desses carnívoros são muito mais raros. Com base em animais mais recentes e de outros lugares, como a Argentina, sabe-se que os membros do grupo podiam alcançar ou até ultrapassar os 9 metros de comprimento, adquirindo ornamentações no crânio que lembravam pares de chifres ou grandes calombos, talvez usados em combates com outros membros da espécie.

Também são marcantes os braços muito curtos e o desenvolvimento da cabeça e da musculatura do pescoço, os quais, nos abelissaurídeos mais recentes, sugeririam um jeito peculiar de caçar e abocanhar a presa, centrado na ação da própria cabeça. Eles possuíam, por exemplo, uma articulação especial da mandíbula, parecida com a das cobras atuais, que conseguem engolir presas muito grandes. “Essa articulação confere melhor eficácia na pegada e aumento da capacidade de abertura da boca”, explica Zaher.

Curiosamente, porém, o Spectrovenator não apresenta esse tipo de articulação. E, como suas patas da frente não foram preservadas, não é possível verificar a hipótese de uma evolução conjunta da bocarra e das “mãos” diminutas. Já o crânio da espécie apresenta estruturas que lembram as ornamentações peculiares de seu grupo, mas sem nada tão destacado quanto o que se vê nos bichos mais recentes e maiores. ​

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