INSTAGRAM ‘PARA CRIANÇAS’: Nova rede não será à prova de pedófilos

O Instagram tem enfrentado críticas de entidades de defesa de crianças e adolescentes desde que confirmou a intenção de criar uma versão para menores de 13 anos, na semana passada. O uso precoce da rede social é algo condenado por especialistas por temer exposição dos jovens a conteúdos inapropriados, tentativas de invasão à privacidade e exposição à pedofilia.

A ONG Campanha por uma Infância Livre de Comerciais (CCFC, na sigla em inglês) enviou uma carta assinada por 35 entidades e 64 pessoas ao presidente-executivo do Facebook (empresa dona do aplicativo), Mark Zuckerberg, pedindo o cancelamento da criação da nova rede social.

O documento lembra um estudo da Royal Society for Public Health de 2017, que elegeu o app como a pior rede social para a saúde mental dos jovens.

“O foco do Instagram no compartilhamento de fotos e aparência torna a plataforma particularmente inadequada para crianças que estão passando por estágios cruciais de desenvolvimento de seu senso de identidade”, diz um trecho da carta.

O movimento diz que a futura plataforma não poderá assegurar a ausência de predadores sexuais e o contato com conteúdos sensíveis, já que as crianças mais novas não estão prontas para lidar com esses desafios porque ainda estão aprendendo a interagir socialmente.

Para Kelli Angelini, gerente da assessoria jurídica do NIC.br (Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR), o contraste entre as idades torna mais difícil haver uma rede segura para todos os públicos. Um pré-adolescente, por exemplo, pode publicar algo que é considerado inapropriado para uma criança menor. “Quando se fala em ter uma plataforma para crianças, não significa que todas que estarão lá têm um perfil para usar uma rede social”, diz.

Mas um ponto central da discussão, presente na carta da CCFC, é que crianças entre 10 e 12 anos que têm contas existentes no Instagram provavelmente não vão migrar para uma versão “infantil” da plataforma.

Mas a nova rede social poderia estimular crianças que ainda não fizeram um perfil na plataforma. “Isso tem que ser muito bem pensado, porque pode gerar consequências negativas para essa faixa etária”, comenta Kelli Angelini.

Na carta a Zuckerberg, as entidades defendem que um dos principais efeitos notados seria a dependência das crianças em checar os celulares constantemente caso iniciem uma conta na plataforma.

‘Rua movimentada’

Mas afinal, os pais devem proibir o uso das redes sociais? O psicólogo Paulo Cesar Porto, professor da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná), explica que a inserção segura de crianças e adolescentes no mundo virtual é possível, mas exige cuidado e monitoramento ativos dos responsáveis.

Deixar as crianças em uma rede social, como o Instagram, é o mesmo risco de colocá-los em uma rua movimentada. Só que o problema é que a maioria dos pais não enxerga. Os cuidados aos riscos de exposição no mundo real têm que ir para o mundo virtual
Paulo Cesar Porto, professor da PUC-PR

Para ele, é difícil que os mais novos tenham bagagem para discernir entre certo e errado, podendo expor a si mesmos e a família a perigos quando, por exemplo, compartilham a localização, o número de sua residência em uma foto e o interior de casa.

As redes sociais ainda podem comprometer o desenvolvimento saudável. “Tem crianças que começam a criar um estereótipo, um personagem que posta determinado tipo de fotos, conteúdos e virtualmente tem um sucesso, que muitas vezes não acontece no mundo fora das telas”, comenta.

O oposto também é comum: crianças se frustram por não cativar atenção nas redes e começam a ter sentimentos de vergonha e fracasso. Segundo o psicólogo, ambos os casos contribuem para a inibição das interações sociais.

Pais atentos

Em 2018, 24,3 milhões de crianças e adolescentes brasileiros entre 9 e 17 anos tinham acesso à internet, segundo a TIC Kids Online Brasil, pesquisa do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br). Desses, 82% possuíam alguma rede social. O Instagram foi o aplicativo com maior crescimento de perfis (alta de 9%, sendo que 45% dos entrevistados tinham uma conta).

Acessar as redes sociais era a atividade mais realizada na internet por 67% dos consultados, atrás apenas do uso de apps de mensagem (77%). No entanto, quando o assunto são as mídias, a coordenadora do levantamento, Luísa Adib, destaca os índices de privacidade e segurança:

  • 5% enviaram dados pessoais para alguém que não conheciam;
  • 8% enviaram foto ou vídeo para alguém que não conheciam pessoalmente;
  • 18% compartilharam o endereço;
  • 24% mentiram a idade;
  • 27% tiveram contato com desconhecidos pelas redes sociais – primeiro lugar no levantamento.

Para proteger os filhos desse cenário, cabe aos pais avaliar qual a hora ideal de liberá-los para usar os apps. Não há um padrão de idade para basear o processo; é preciso avaliar a maturidade individual e ter disposição para orientá-los.

O que diz o Instagram

A empresa diz que ainda está “explorando a possibilidade” de criar um Instagram para o público infantil, mas diz que a plataforma “deve priorizar a segurança e privacidade das crianças”. Além disso, está consultando especialistas em desenvolvimento e segurança infantil, saúde mental e privacidade para criar o app e que não exibirá anúncios para esse público menor de idade.

Em seu modelo original, o Instagram permite apenas que maiores de 13 anos criem um perfil. Para crianças e pré-adolescentes menores, é obrigatório que uma pessoa seja responsável pelo monitoramento e tenha seu nome indicado na biografia da página. Irregularidades podem ser denunciadas via questionário.

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